SEMPRE JA ERA






São tidos como “bons tempos” aqueles em que aprendíamos as coisas e este aprendizado valia para sempre. Para sempre, pensávamos.

Bons tempos eram também aqueles em que nossos pais faziam um negócio e este era rigorosamente honrado,

mesmo que nenhum contrato cheio de cláusulas e, principalmente, de letras miudinhas, fosse assinado.

Tempos em que barba na cara e fio de bigode eram sinônimos de honra e decência, valendo mais que documentos.

Há muitas outras situações que nos podem remeter para “bons tempos”.

Talvez, daqui a 20 anos, alguém dirá que bons tempos eram aqueles em que tudo era feito com contratos

onde valia mais a esperteza do que a verdade, em que mesmo assinados os contratos podiam ser questionados na justiça,

em que o cidadão podia colocar dúvidas em qualquer coisa, desde que pagasse um advogado para fazê-lo,

pois a lei abria espaço para qualquer tipo de questionamento.

Ou seja, daqui a 20 anos os bons tempos a serem lembrados talvez sejam estes que estamos vivendo agora. É possível.

Hoje, as mudanças ocorrem muito rapidamente.

Não dominamos a técnica do controle do tempo, ele se esvai sem que nos demos conta.

Quando acordamos, tudo mudou e o que era de um jeito já está diferente. Menos nós, que continuamos iguais.

Levamos tempo demais para perceber mudanças e mais ainda para mudar.

E perdemos mais tempo, mais energia, mais motivação, mais oportunidades.

É comum ficarmos focados no nosso próprio trabalho, do jeito que o realizamos desde sempre, com pequenas adaptações.

“Sempre foi assim, porque vou mudar?”

Focados apenas nele e desfocados de tudo o mais que acontece à nossa volta ficamos impedidos de nos abrir para outras realidades.

Como já avançamos um pouco na idade e já temos algumas convicções, que gostamos de dizer “com certeza”,

também nos tornamos mais teimosos porque consideramos que as nossas vivências e experiências precisam ter valor imutável.

Logo, o que poderia nos ensinar um colega mais jovem, que nunca passou por tantas coisas como nós já passamos?

Entretanto, temos que nos reinventar. Constantemente.

Novas tecnologias, novos poderes com força descomunal, perda dos valores tradicionais e uma nova escala de valores

que coloca ética, moral, respeito e outras antiguidades num plano secundário, aliados ao consumismo doentio e incontrolável,

impõem que nos adaptemos, nos reinventemos, nos façamos totalmente abertos para as novas circunstâncias e realidades.

E nos obrigam a lembrar, constantemente, que tudo dura um pouco, que sempre, nunca, jamais, entre outros denominativos,

são apenas forças de expressão e não contém mais o seu valor de verdade.

Como já não significa mais imediatamente, um minutinho pode ser uma hora ou mais

e toda a linguagem precisa ser reaprendida nos seus novos significados.

Ai de quem ficar parado no tempo!

Antes que se dê conta estará fora do mercado, ultrapassado, chamado de dinossauro.

Ou seja, uma lembrança de um passado remoto, embora bem recente.

A tarefa de reaprender, de reinventar-se constantemente, não é nada fácil. Pelo contrário, é parada dura! Poucos conseguem.

A questão não se refere apenas ao mundo empresarial, aos negócios. Vale também para a educação dos filhos.

Pais, hoje, preferem delegar este dever a uma escola. Pagam bem caro, reclamam das mensalidades,

mas reconhecem que a escola tem mais capacidade do que eles próprios.

Em português bem claro, a escola educa melhor que os pais.

Parece que aí está implícita uma confissão de omissão, de renúncia, de fuga de compromisso e de autojustificação...

As escolas, por sua vez, lidando com o tema no seu cotidiano e possuídas do espírito inquieto de crianças e jovens sempre ligados no fato novo,

começam a ter dificuldades maiores quando os pais, conscientes das suas limitações e incompetências, passam a exigir daquelas instituições “parceiras”,

às quais pagam para fazer o seu serviço, valores dos quais eles ainda carregam lembranças. Daqueles “bons tempos”...

Então, cobram da escola o ensino da ética, da moral, do respeito, da educação, dos bons costumes, da honestidade, da verdade.

Eles sabem que isso tudo é bom e suspeitam que haverá de chegar o dia em que estes valores ressurgirão.

Reinventar-se é a palavra de ordem.

Ficar ligado e tentar entender o que parece tão difícil e que pode ser até mesmo o uso adequado do controle remoto da tevê

ou de qualquer novo eletrônico que surge a cada novo amanhecer. Encher-se de paciência e boa vontade (com uma boa dose de resignação),

aceitar que o que era “para sempre” já era e manter-se conectado à vida, pois é melhor assim do que ficar esperando

mais um pouco até que inventem um modo de nos conectarem numa tomada ou nos colocarem uma bateria de atualização.

Pensar nisso pode nem ser bom, mas é conveniente.

Melhor do que pensar é agir, pois ficar só pensando vai encher a cabeça de besteiras.





(Autor: Egon Hilario Musskopf - Jornalista)